segunda-feira, agosto 31, 2009

Quem viu a cara da morte, Com seu queixo caído, Avental dividido, Com ar de deboche? Era só tristeza, Nenhuma leveza, Não sabia voar! Trazia poliomielite nos olhos, O pescoço sujo de raxixe, Não podia chorar! A cara da morte Era só tristeza, E fazia o dia, Em agonia, Em seus braços desmaiar!

quarta-feira, agosto 05, 2009

Dizia sentir o cheiro das estações. Afirmava que as flores, quando desabrocham, explodem em um barulho ensurdecedor. Por isso, sempre o via andando pelas ruas com os dedos tampando os ouvidos. Das explosões das flores, me disse ser a dos ipês a mais suave. Adorava ficar ouvindo os ipês se vestindo em explosiva beleza. Ria, ria, horas repetidas, sozinho, sentado nas esquinas tristes da vida. Agora, bem no alto da serra, floriu, agarrada em alguma árvore, uma bela orquídea; me contou. Um dia, se declarou enfeitiçado pela pintura de um lago que o consultório médico trazia. Sempre era retirado de lá, da forma mais agressiva. Ficava por horas namorando a oleosa paisagem. Já era o fim da tarde quando ninguém na recepção ficou. Ele entrou de mansinho e na pintura se banhou, mergulhou com os peixes, nadou com as aves e foi feliz. Quando voltou, estava molhado em primavera. Para os que o olhavam espantados, ele deu apenas um sorriso, desses que não conseguem esconder a felicidade, e se foi, caminhando, lentamente, até que a noite chegou, a luz esfriou e o sonho apagou...